Sem dúvida, a descoberta da molécula de DNA está entre as histórias mais fascinantes da ciência moderna. Essa trajetória envolve décadas de pesquisas intensas, descobertas interligadas ao longo do tempo e contribuições fundamentais de cientistas de diversas partes do mundo. Entender como os pesquisadores desvendaram, pouco a pouco, essa molécula — base da vida — é essencial para valorizar tanto a complexidade da investigação científica quanto a importância do trabalho colaborativo, da persistência e da inovação constante no avanço do conhecimento biológico.
Contexto Histórico
No início do século XX, a biologia estava em busca de entender qual era a molécula responsável por carregar a informação genética nos organismos vivos. Na época, os cientistas acreditavam que as proteínas, pela sua complexidade e diversidade, eram as melhores candidatas para essa função. O DNA, por sua vez, era visto como uma molécula estrutural simples e repetitiva, presente nos núcleos das células, mas com função pouco clara.
A ascensão do DNA como material genético
Durante as décadas de 1940 e 1950, vários experimentos começaram a mudar essa visão. Um dos mais importantes foi o experimento de Avery, MacLeod e McCarty, em 1944, que mostrou que o DNA era o responsável pela transformação genética em bactérias. Esse experimento foi fundamental para estabelecer o DNA como o material genético, embora tenha encontrado resistência na comunidade científica.
No ano de 1952, dando continuidade aos avanços obtidos por pesquisas anteriores, o experimento de Hershey e Chase representou um passo decisivo na consolidação do papel do DNA. Na ocasião, os cientistas utilizaram vírus bacteriófagos marcados com isótopos radioativos — uma abordagem inovadora para a época. Como resultado, conseguiram demonstrar, de forma definitiva e convincente, que o DNA, e não as proteínas, era o verdadeiro material genético responsável pela transmissão da informação hereditária.
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Rosalind Franklin e a Difração de Raios-X
Enquanto isso, a estrutura tridimensional do DNA ainda era um mistério. Dois cientistas britânicos, Rosalind Franklin e Maurice Wilkins, trabalhavam com cristalografia de raios-X no King’s College London. Franklin produziu, em 1951, a célebre “Fotografia 51”, uma imagem que revelou aspectos cruciais da estrutura helicoidal da molécula de DNA.

A qualidade e precisão dos dados de Franklin foram cruciais, embora seu trabalho tenha sido inicialmente pouco reconhecido. Suas imagens ajudaram diretamente Watson e Crick a entender como as bases nitrogenadas estavam organizadas.
Watson, Crick e a proposta da dupla hélice
Na época, James Watson, um jovem biólogo americano, e Francis Crick, um físico britânico, trabalhavam no Laboratório Cavendish, em Cambridge, Inglaterra. Ambos, motivados pelo interesse crescente na genética, estavam empenhados em desvendar a estrutura tridimensional do DNA.
A partir da análise de dados já publicados, aliados às imagens de difração de raios-X obtidas por Rosalind Franklin, Watson e Crick conseguiram, em 1953, propor o modelo da dupla hélice do DNA. Esse modelo descrevia, de maneira inovadora, duas cadeias de nucleotídeos enroladas entre si, em que as bases nitrogenadas se emparelham especificamente (adenina com timina, citosina com guanina), ligadas por pontes de hidrogênio — formando, assim, uma estrutura altamente estável e, ao mesmo tempo, capaz de se replicar com notável precisão.
Pouco tempo depois, a publicação do artigo de Watson e Crick na revista Nature, em abril de 1953, causou um impacto profundo na comunidade científica. Essa contribuição não apenas revolucionou a biologia molecular, como também abriu caminho para uma nova era no entendimento da genética moderna.
Reconhecimento e controvérsias
Em 1962, Watson, Crick e Maurice Wilkins (colaborador de Franklin) receberam o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina, em reconhecimento ao impacto da descoberta da estrutura do DNA. Já Rosalind Franklin, cuja contribuição foi essencial para o avanço da pesquisa, faleceu prematuramente em 1958, aos 37 anos, antes da premiação. Por isso, não pôde receber o reconhecimento oficial, embora a comunidade científica valorize cada vez mais sua importância.
Hoje, Franklin é considerada uma figura fundamental nessa descoberta e simboliza tanto a relevância do trabalho científico feminino quanto a importância da ética na ciência.
Impactos da descoberta
A partir da compreensão da estrutura do DNA, tornaram-se possíveis avanços sem precedentes em diversas áreas. Entre elas, destacam-se a manipulação genética e o desenvolvimento da medicina personalizada.
Por conseguinte, a descoberta do modelo da dupla hélice representou o ponto de partida para uma verdadeira revolução na biologia molecular. Essa transformação, por sua vez, mudou profundamente a ciência. Além disso, impactou de forma significativa setores como a indústria farmacêutica e a agricultura.
Referências
Nature (artigo original de Watson e Crick, 1953)
https://www.nature.com/articles/171737a0
National Human Genome Research Institute (NHGRI) – História da Descoberta do DNA
https://www.genome.gov/genetics-glossary/Double-Helix
National Geographic – Rosalind Franklin: Qual o seu verdadeiro papel na descoberta da estrutura do DNA? https://www.nationalgeographic.pt/ciencia/rosalind-franklin-qual-o-seu-verdadeiro-papel-na-descoberta-da-estrutura-do-adn_3800